O Brasil não é o melhor lugar para se começar uma startup. Por aqui, abrir uma empresa é tarefa complicada e a legislação trabalhista é rígida demais para os pequenos empreendedores. Não por acaso, o país vai mal no ranking dos mais indicados para se empreender: em 2011 estávamos em 120º, neste ano, ficamos em 126º. O detalhe é que a lista tem 183 posições (veja aqui).
O ranking é promovido desde 2003 pela Doing Business, uma organização que conta com apoio da Internacional Finance Corporation (IFC) e do Banco Mundial. Para se chegar à pontuação, são analisados dez critérios, como obtenção de crédito, impostos, registro de propriedade e facilidade para se começar um negócio. O Brasil piorou em metade, outros quatro mostraram melhora e, em "cumprimento de contratos", o score foi o mesmo entre 2011 e 2012.
Reinaldo Normand, fundador e CEO da desenvolvedora de jogos sociais 2Mundos, não vê surpresa quanto ao mal desempenho do país. "Falta 90% para nos tornarmos um polo de startups", comenta ele, que já passou pelo Vale do Silício e trabalhou até na China, com uma outra criação sua, o Zeebo. "Nos últimos dois anos avançamos apenas 10%. Mas avançamos."
Para ele, há três temas que impedem o crescimento do mercado inovador em terras tupiniquins: educação, impostos e burocracia, e mindset. E o primeiro é bem sério: "Infelizmente não há como construir uma startup de TI no Brasil com mais de 100 engenheiros e gerentes de produto sem esbarrar no problema da mão de obra qualificada", afirma.
"A competição hoje é global, não estamos mais nos anos 1980. Fazer um Google, Zynga, Facebook ou Apple aqui seria impossível na conjuntura atual. Prova disso é que não temos nenhuma empresa de TI globalizada com tecnologia, produtos e/ou modelos de negócios inventados por aqui. Temos empresas de serviço e outsourcing competentes, que são o primeiro passo e muito bem vindas para abrir o mercado, mas precisamos ir muito além."
Burocratização
Abrir um negócio por aqui é algo realmente complexo. O Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) tem um guia "prático"para registro de empresas que mostra o quão longo é esse processo. É necessário reunir vários documentos e passar por uma série de etapas que envolvem Contrato Social, CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica), alvará de funcionamento, inscrição estadual, cadastro na Previdência Social e o aparato para emissão de notas e autenticação de livros fiscais. Há taxas em todas as instâncias.
"Aqui se leva meses para botar em pé uma startup, e isso teria de ser reduzido para dias. Nos primeiros meses da minha, gastei metade do meu tempo só com exigências burocráticas improdutivas", reclama Normand. "Em três, quatro meses, o mundo muda."
A contratação de funcionários não chega a ser difícil, mas o processo é caro e excessivamente formal - cerca de 37% do custo de cada empregado é referente a impostos, e há três tipos de recolhimento. O primeiro faz parte das Contribuições Sociais Previdenciárias (chamadas comumente de INSS), que vão dos 20% a cerca de 26%, segundo Marcel Cordeiro, professor nas áreas trabalhista e previdenciária nos cursos de pós graduação da PUC/SP e da Escola Paulista de Direito. Há também as contribuições do "sistema S": Sesi, Senai, Sest, Senat etc., que totalizam 5.8%, e o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), que leva 8%. "E até hoje ninguém sabe ao certo o que é, se é salário diferido, poupança forçada, tributo... ninguém sabe", critica Cordeiro.
Além dos impostos, cada funcionário brasileiro trabalha 11 meses e recebe por mais de 13, contando 13º e férias (um salário, mais 1/3). Por isso algumas empresas escolhem contratar estagiários e aprendizes - os primeiros nem podem ser considerados empregados, recebem apenas uma bolsa definida junto à empresa, um seguro de vida e vale transporte. Já os aprendizes possuem direitos de trabalhadores, com desconto de apenas 2% referente ao FGTS. Mas não há como montar uma empresa só com aprendizes porque a legislação proíbe que mais de 15% dos funcionários estejam nessa situação.
Mentalidade
Reinaldo Normand falou sobre um terceiro problema, o mindset. Para ele, o brasileiro ainda não pensa grande, nem de maneira focada e estruturada por ser muito paternalista. Falta dividir conhecimento e networking. "Parte disso é cultural, parte é culpa do sistema de ensino que é totalmente desconectado com a realidade do mercado e do nosso tempo", declara.
O CEO da 2Mundos diz que isso está mudando, pois há um grande progresso nesse sentido, mas ele alerta, não adianta ficar sentado esperando que as coisas aconteçam: "Depende mais da sociedade civil do que do governo."
Fonte: Olhar digital
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